Não havia cruz
nem a luz havia mais
onde houve a vida
onde a flor nascia
nem vestígios, nem sinais.
Do amor, de um dia
só uma placa:
– “Aqui jaz”
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UTI
Meu amor respira por aparelhos
suspira, ferido
meu amor espancado, quebrado, moído
meu amor destruído
oscila, abandonado à própria sorte.
Meu amor esmagado
rasgado, sofrido
meu amor destroçado
retalhado de cortes
agoniza
paralisado
entre a vida e a morte…
Solidão
A solidão da noite me corta
me entorta, me rasga
O silêncio da noite me oprime
me fere, me cala
O escuro da noite me assusta
me abala, deprime
O frio da noite me gela
me seca, devasta…
A noite, tantas vezes amiga
justo ela, tantas vezes sublime
hoje me fere, me afoga, me mata
hoje
É só crime
Ressurreição
Se é preciso a morte,
que eu morra.
Sem amor e sem destino.
Morra completamente
indigente e clandestino.
E onde o corpo não houver,
nem a carne nem a vida,
quem sabe a sorte, a arte,
uma benção esquecida,
brote, nesse charco,
nessa terra apodrecida…
E o que um dia foi semente
Floresça,
Alta, firme, forte
E cresça
Com folhas, frutos e flores
e pássaros pousando nos galhos…
Houve um Tempo
“Abrindo um antigo caderno
foi que eu descobri
antigamente eu era eterno”
(Paulo Leminski)
Houve um tempo em que eu olhava a vida com os olhos de poeta…
E a existência tinha em mim um pulso, um sentido, um ímpeto
Todo o mínimo em mim, era o máximo
A pequena luz da menor estrela era o bastante
para iluminar todo o universo
E o menor segundo,
Era o que bastava para a minha eternidade.
Descobri o amor antes mesmo da amada.
Descobri a flor, o sol, o céu, a lua e as estrelas,
Descobri o mar…
Descobri os rios, os lagos, fontes, o horizonte
Conheci o vento…
Descobri o ar.
E conheci o tempo…
E vi, com ele, a vida se esgueirar..
Poema do Fundo do Poço
No osso, a dor que me corrói
e moe os meus sentidos
e dói no meu sangue…
Desesperança
Hoje eu sou o poeta da morte
sem prumo, sem norte, sem rumo
sem fumo, sem sorte
a alma manchada de sangue
o corpo rasgado de cortes.
De dia, um rascunho de nada
de noite, uma sombra no escuro.
Vou aos trancos
procurando algum barranco
Aos prantos
me esquivando do futuro
pelos cantos
flancos, becos, muros
mendigando afeto
enquanto duro…
Cinzas
Já secaram em mim todas as lágrimas
Já doeram mim todas as dores
e todas as cores, por fim, se tornaram cinzas.
O que será de mim, depois de tantos amores?
Caminhos
A falsidade é uma das caracterísiticas mais tristes e deprimentes do ser humano..
A ingenuidade, uma das mais perigosas…
Quando se encontram pelo mundo, os dois, o falso e o ingênuo, é sempre o segundo, quem leva a pior…
Pelo menos em tese.
Mas será mesmo…?
Levaria essa escolha, a de acreditar sempre, a um abismo maior do que a outra, a de enganar sempre?
Já vi muita gente cair e se machucar feio, por ser do primeiro tipo. Mas justamente por serem assim, nunca estão sozinhos… Há sempre um ombro amigo, um afago, um olhar carinhoso, um braço amigo ajudando a levantar.
Já os falsos, que enganam, mentem, traem ou trapaceam, esses um dia, em algum momento, também caem. E, mais do que o dano da queda, acabam amargando a dor pior da solidão.